O Brasil se comprometeu internacionalmente a desenvolver uma política abrangente para as demências em colaboração com a Organização Mundial da Saúde, porém o Ministério da Saúde alega que a criação de políticas específicas para a doença não é competência do Governo Federal, contrariando o compromisso prévio. A Federação Brasileira de Alzheimer, diante desse cenário, busca o diálogo para a reavaliação dessa posição.
No contexto complexo da saúde pública brasileira, a incidência crescente de Alzheimer e outras demências exige uma resposta efetiva e coordenada do Governo Federal.
Na recente Audiência Pública no Senado, presidida pelo Senador Paulo Paim, a Federação Brasileira das Associações de Alzheimer apresentou evidências incontestáveis da urgência de uma resposta articulada. Nesse mesmo dia, uma Carta de Apelo foi enviada à Ministra da Saúde, Nísia Trindade.
No entanto, a resposta do Ministério da Saúde, alegando que a criação de uma política pública específica para demências não é atribuição do Governo Federal, mas sim de Estados e Municípios, nos deixa frustrados e, devemos dizer, indignados.
Dados alarmantes
O Brasil possui cerca de 2,4 milhões de casos estimados de demência, sendo que 73% das despesas de cuidados recaem sobre as famílias. O SUS, infelizmente, não atende à maioria das necessidades dessas pessoas, conforme aponta o recente Relatório Nacional sobre Demência no Brasil, elaborado para orientar ações do Ministério da Saúde.
Apesar das complexidades, a construção de uma Política Nacional de Cuidado Integral às Pessoas com Alzheimer e outras Demências deve ser reconhecida como uma responsabilidade inalienável do Governo Federal. Essa convicção se reflete no Projeto de Lei 4364/20, aguardando votação na Câmara dos Deputados.
Para nós que conhecemos e convivemos com a realidade das famílias impactadas pela demência, a instituição de uma política pública nacional é algo inegociável, pois se trata de garantir direito ao diagnóstico em estágios iniciais da doença, a tratamentos não-farmacológicos, a linhas de cuidado que permitem autonomia e independência por mais tempo e dignidade até o fim de vida.
Porque o Brasil precisa da Política Nacional de Cuidados em Demências:
· Necessidade de coordenação multissetorial
Não é admissível que o Governo Federal se abstenha neste caso de sua função essencial de gestor da saúde, como já evidenciado em políticas específicas para outras doenças. A questão demanda uma coordenação nacional multissetorial, regida por princípios como empoderamento, engajamento e colaboração entre diferentes setores.
· Compromisso internacional
O Brasil é signatário do Plano de Ação Global em Resposta à Demência na Saúde Pública, comprometendo-se internacionalmente a desenvolver uma política nacional abrangente em colaboração com a Organização Mundial de Saúde (OMS).
· Prioridades definidas
O acordo estabelece ações em sete áreas prioritárias essenciais para garantir os direitos das pessoas com demência e seus familiares, desde a priorização na saúde pública até a pesquisa e inovação.
· Estudos revelam a gravidade da situação
Em 2018, a Alzheimer’s Disease International (ADI) divulgou o Dementia Innovation Readiness Index, uma análise do preparo da Argentina, Brasil, China, Índia e Arábia Saudita para enfrentar a demência, avaliando em 10 categorias. O Brasil apresentou o menor score quando comparado aos outros quatro países. Já o Dementia Innovation Readiness Index, de 2020, que avaliou a capacidade de cuidar de pessoas com demência em 30 das mais importantes cidades do mundo, classificou São Paulo em último lugar.
· Complexidade da Demência
Respostas simplistas não atendem à complexidade da situação. A realidade de 2,4 milhões de indivíduos com demência no Brasil exige comprometimento com diagnóstico precoce, tratamentos adequados e suporte aos familiares cuidadores.
A Federação Brasileira de Associações de Alzheimer reitera seu compromisso de colaborar para desenvolver a capacidade do Brasil na área de cuidado em demências, alinhada com as prioridades identificadas pela OMS. Continuaremos nosso trabalho incansável, porém, para uma mudança significativa, necessitamos que o Ministério da Saúde desempenhe seu papel essencial de competente gestor da saúde.
Estamos à disposição para contribuir ativamente nesse processo e esperamos que juntos – sociedade civil, comunidade científica e Governo Federal, possamos avançar na resposta do Brasil às demências.