Aplicativo brasileiro é projetado para conversar com cuidador, reduzir estresse e elevar qualidade do cuidado

Federação Brasileira das Associações de Alzheimer
  • Projeto baseado em Inteligência Artificial (IA) tem se destacado em apresentações internacionais e está em fase de captação de financiamento para chegar a quem precisa.

    Um momento importante para a inovação na saúde no Brasil ocorreu durante o último fim de semana, no Hospital das Clínicas/USP, no Hub InovaHC, com a participação do país na Maratona de Inovação em Sistemas de Saúde organizada pelo Laboratório de Inovação em Sistemas de Saúde da Harvard. Este evento, focado em construir sistemas de saúde de alto valor, explorando a Inteligência Artificial (IA), atraiu talentos de todo o mundo, com representantes de Boston, Buenos Aires, Kyiv, Lima, Londres, Santiago,  São Paulo, entre outras. O Brasil foi representado pelo projeto Humanis, que propõe um aplicativo de orientação e suporte emocional para quem cuida de pessoas que vivem com Alzheimer e outras demências.

    O professor doutor Walter Lima, especialista em Sistemas Cognitivos Artificiais pela Unifesp e líder do projeto, compartilhou suas experiências sobre o desafio de apresentar uma solução complexa em um formato compacto durante o evento. “Foi um desafio participar da maratona de inovação, onde precisávamos resumir a complexidade da nossa solução em apenas três minutos de apresentação. Conseguimos, sintetizar a complexidade científica e tecnológica da nossa solução, a qual foi recebida com entusiasmo pelos jurados e pelo público”, conta Lima. O projeto já havia se destacado recentemente na maratona organizada pela Jain, instituição holandesa de pesquisas em Inteligência Artificial.

    Orientação nos momentos desafiadores

    O aplicativo desenvolvido pelo projeto Humanis oferece orientação e suporte personalizado para os cuidadores não profissionais, como familiares e amigos, a fim de aprimorar a qualidade do cuidado e promover o bem-estar dos envolvidos. O projeto visa, a partir de interação por voz, entre o cuidador não profissional e o sistema inteligente, permitir um diálogo empático, informativo e de descompressão mental, visando à melhora da qualidade da saúde mental do parceiro de cuidado.

    O diferencial do projeto reside em sua abordagem psicossocial, que propõe a interação dos usuários com uma persona virtual, simulando um amigo experiente em cuidados com idosos que apresentam síndromes demenciais. Essa interação permite a troca de informações em tempo real, trazendo humanidade ao processo de cuidado por meio da Inteligência Artificial Generativa.

    A relevância da ferramenta é respaldada por estatísticas preocupantes sobre a realidade dos cuidadores no Brasil. Segundo o Renade – Relatório Nacional sobre Demência, elaborado pelo Hospital Alemão Oswaldo Cruz em colaboração com o PROADI-SUS, a grande maioria dos cuidadores é composta por mulheres (86%), que dedicam em média 10 horas diárias ao cuidado, sem receber qualquer compensação ou suporte formal. É comum entre as cuidadoras e  cuidadores o relato de sobrecarga psicológica, incluindo sintomas de ansiedade e depressão.

    Neste contexto, a solução proposta pelo projeto Humanis se apresenta como uma inovação promissora, oferecendo não somente orientações práticas e informações pertinentes, mas também suporte emocional. Walter Lima é um destacado pesquisador em Sistemas Cognitivos Artificiais e Robótica Social da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com vasta experiência acadêmica e contribuições no âmbito da comunicação e tecnologia. A motivação para o desenvolvimento deste projeto veio reconhecimento da necessidade urgente de oferecer suporte aos parceiros de cuidado desassistidos pelo sistema de saúde.

    Na área da saúde, os aplicativos estão sendo cada vez mais usados para comunicação, monitoramento e educação do paciente, para reduzir a carga de doenças relacionadas à pobreza, para melhorar o acesso a serviços de saúde, diagnóstico clínico e adesão ao tratamento e para o manejo de doenças crônicas. Na chamada “saúde digital”, o uso de aplicativos para suporte aos cuidadores de pessoas idosas com síndromes demenciais, como o proposto neste projeto, visa melhorar a saúde mental e o bem-estar daqueles que cuidam, ampliando competências e conhecimentos para gerir o estresse associado ao manejo das rotinas e comportamentos. Portanto, são recursos integrados a práticas de bem-estar, sem interferências no processo clínico/médico, de responsabilidade dos profissionais da área da saúde”, explica o pesquisador.

O cientista Walter Lima, líder do projeto Humanis.
  • Necessidade e oportunidade

    A equipe do Humanis é formada por profissionais de diversas áreas, incluindo Alan Cronemberger Andrade, neurologista especializado em doença de Alzheimer e saúde digital para problemas cognitivos; Mariel Montiel Aponte, médica doutoranda em neurologia com ênfase em cognição e comportamento pela Unifesp, com especialização em educação para cuidadores de pessoas com demência. Para a Maratona de Inovação em Saúde de Harvard, foram convidados para ajudar na elaboração da apresentação,  André Coutinho, designer e pesquisador em inovação e tecnologia, desenvolvedor de dispositivos computacionais de uso pessoal; e Pedro Brito, estudante de medicina pela Unifesp e diretor de uma organização estudantil em psiquiatria clínica, com interesse em inovação para a saúde mental.

    O reconhecimento do projeto Humanis na maratona reforça a relevância da cooperação internacional no desenvolvimento de soluções digitais de saúde. Ainda em busca de apoio e financiamento, o projeto representa uma oportunidade para investidores e patrocinadores interessados em contribuir para o avanço no atendimento de pessoas que vivem com demência e no suporte aos seus cuidadores.

    Alzheimer e IA

    Para além de soluções de suporte ao cuidado, como a do projeto Humanis, as pesquisas envolvendo Inteligência Artificial e a doença de Alzheimer estão se expandindo rapidamente, abrindo novos caminhos para diagnósticos mais precisos, monitoramento da progressão da doença e até mesmo potenciais tratamentos.

    Detecção precoce e diagnóstico: Um dos avanços mais promissores da IA é na detecção precoce do Alzheimer. Pesquisadores têm utilizado algoritmos de aprendizado de máquina para analisar imagens de ressonância magnética (MRI) e tomografias computadorizadas do cérebro, identificando padrões que podem preceder os sintomas clínicos. Estudos mostram que a IA pode identificar sinais de Alzheimer anos antes de os primeiros sintomas aparecerem, permitindo intervenções mais precoces.

    Monitoramento da progressão: A IA também é usada para monitorar a progressão da doença de Alzheimer. Algoritmos são capazes de analisar mudanças ao longo do tempo em imagens cerebrais, na fala e no comportamento, ajudando a avaliar como a doença evolui em cada paciente. Isso é crucial para personalizar o tratamento e ajustar os cuidados necessários.

    Descoberta de novos tratamentos: No campo da farmacologia, a Inteligência Artificial está sendo aplicada para prever a eficácia de compostos medicamentosos no tratamento do Alzheimer. Por meio de análises complexas, a IA pode identificar potenciais medicamentos que poderiam ser readaptados para tratar a doença, acelerando o processo de descoberta de novos tratamentos.

    Análise de linguagem e comportamento: A IA está sendo usada para analisar padrões de linguagem e comportamento em pessoas com Alzheimer. Isso inclui a análise de mudanças na fala, escrita e interações sociais, que podem indicar o início ou a progressão da doença.

    Modelagem de doenças e simulações: Através de modelos computacionais avançados, a Inteligência Artificial  está ajudando a simular a progressão do Alzheimer no cérebro, permitindo aos pesquisadores entenderem melhor como a doença se desenvolve e como diferentes tratamentos podem afetá-la.

    Com o rápido desenvolvimento de novas tecnologias e a crescente disponibilidade de dados, é provável que vejamos ainda mais inovações importantes nessa área nos próximos anos. Esperamos que o Brasil valorize as soluções desenvolvidas pelos nossos cientist